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Críticas a Álbuns
Crítica a Álbum :: Moonspell - 1755 (2017)
2017-11-01 20:03:34 | Hugo Miguel Delgado

Os Moonspell estão de volta aos lançamentos discográficos com 1755, um álbum cantado inteiramente em português e dedicado na íntegra ao terramoto que no dia 1 de Novembro de 1755 desvastou Lisboa. Depois de terem lançado Extinct em 2015, um belíssimo trabalho que nos apresentou uns Moonspell a abraçarem as suas múltiplas facetas de forma harmoniosa e equilibrada, nada nos fazia prever que o colectivo formado da Brandoa voltasse a reinventar-se, podendo dizer-se que este novo trabalho é também ele um terramoto em potencial. Os temas de avanço já o faziam prever, mal os primeiros versos de Todos os Santos se fizeram ouvir, e as posteriores audições do álbum confirmaram o parecer inicial. 1755 está longe de ser um álbum simples de escutar. Os temas soam estranhos. As composições parecem seguir linhas diferentes daquelas a que estamos habituados. As letras em português parecem fora de sítio, mesmo quando comparadas com outros temas em que a banda já havia abraçado a língua materna. Falta-nos referências do passado. Falta-nos a voz quente de Fernando Ribeiro e o dark romanticism que sempre acompanhou a sonoridade da banda.

Esta é a pena deste álbum. E, simultaneamente, a sua virtude. Afinal, os Moonspell sempre assumiram o desafio de se renovarem, porque haveriam de se repetir a eles próprios para recriar um terramoto que destruiu uma cidade e que causou, em conjunto com o maremoto e com os incêndios que se seguiram, dezenas de milhares de mortos? Mesmo correndo o risco de serem mal interpretados e mal recebidos pelos fãs da sua sonoridade - e já vimos situações destas acontecerem no passado, como no caso dos Judas Priest com o seu álbum Nostradamus - , os Moonspell mais uma vez assumiram o risco e procuraram apresentar-nos o terramoto de forma crua e directa, sem romantismos nem disfarces.
Os Moonspell que conhecemos ainda cá estão, como podemos verificar se escutarmos com atenção em diversos momentos, como no tema de abertura Em Nome do Medo, que usa como base o tema com o mesmo nome do álbum Alpha Noir mas completamente reorquestrado, repleto de pormenores dramáticos e efeitos dissonantes. Também nos temas Evento e 1º de Novembro podemos encontrar referências à sonoridade habitual da banda, com este último tema a dar mesmo um piscar de olhos às origens da banda, com um riff a fazer lembrar os tempos de Wolfheart. Este é mesmo um dos pontos altos deste trabalho, ao combinar a sonoridade da banda com esta nova abordagem mais crua, a rasgar, com Fernando Ribeiro repleto de raiva e um belíssimo interlúdio, tão triste quanto adequado ao tema. E, que dizer da extraordinária participação do fadista Paulo Bragança no tema In Tremor Dei, num dueto arrepiante, capaz de nos transportar para as devastadas ruas de Lisboa, em chamas!
Uma palavra ainda para os coros que se fazem ouvir em todos os temas, imponentes e angelicais, épicos e dramáticos, a antítese da voz crua de Fernando Ribeiro, complementando por oposição.
As linhas melódicas dos riffs e orquestrações muitas vezes levam-nos para ambientes arábicos/orientais, com ritmos tribais a fazerem-nos sentir as pedras a cairem das paredes dos prédios, numa sequência vertiginoso que primeiro estranhámos até finalmente as letras e melodias se entranharem nos nossos ouvidos e ficarem na nossa memória. Esta faceta mais aguerrida da banda termina com o tema de encerramento Lanterna dos Afogados, uma inesperada versão arrastada e melancólica de um original dos brasileiros Os Paralamas do Sucesso que destoa ligeiramente devido às expressões brasileiras mas que acaba por ser um final adequado.

Não sendo possível garantir que este álbum irá agradar, pelo menos de imediato, a todos os fãs dos Moonspell, pela já referida abordagem sonora seguida neste trabalho, que os aproximou mais do metal sinfónico do que do seu habitual metal gótico, mas não podemos deixar de aplaudir a coragem da banda em assumir este desafio e de se reinventar à medida da necessidade. Com interpretações irrepreensíveis e um enorme trabalho de composição e orquestração, não podemos também deixar de referir a fantástica produção, por parte de Tue Madsen, capaz de juntar todas estas diversas camadas sonoras, muitas vezes contrastantes, num único bloco, de tal forma que podemos distinguir de forma clara todos os instrumentos e toda a complexidade das interpretações.

1755 é um álbum muito difícil de avaliar através de um simples número, quer pelo desafio em questão quer pelas expectativas dos fãs, tendo em conta a sonoridade e a história da banda. No entanto, o resultado final terá sempre de ser amplamente positivo, ainda que se aceite que este não será um trabalho consensual junto dos fãs. Contas feitas, 1755 merece-nos um 89 / 100.

Rating: 89%



1755 - album cover
01Em Nome Do Medo
021755
03In Tremor Dei
04Desastre
05Abanão
06Evento
071 De Novembro
08Ruínas
09Todos Os Santos
10Lanterna Dos Afogados
 
Produzido porTue Madsen
Capa criada porJoão Diogo
 
Moonspell - band photo


MOONSPELL (PT)